Espetáculo ambientado no Marajó ganha as redes sociais



O realismo fantástico de 'Os Encantados do Sossego' é encenado pela atriz Fernanda Thuran

O teatro é uma das formas de arte mais antigas, críticas e sempre abertas às experimentações. Neste momento de distanciamento social, o teatro está passando por uma reformulação com o público em casa e os atores a distância ao vivo ou em vídeos.
O desafio é superar as distâncias com interpretações que misturam elementos do audiovisual e da arte cênica. Essa é uma das experimentações que o espetáculo “Os Encantados do Sossego” traz para os internautas.
A peça de autoria e direção de Monique DeBoutteville utiliza o realismo fantástico marajoara para misturar histórias de mitos e lendas com uma realidade dura e difícil em um dos locais conhecidos por ter os piores índices de desenvolvimento humano e ao mesmo tempo uma natureza deslumbrante. O espetáculo, que estreou no dia 30 de julho, voltará a ser disponibilizado nas redes sociais e na plataforma Youtube no canal da atriz Fernanda Thuran a partir desta quinta-feira, 20.
O espetáculo é definido como uma “experimentação audiovisual de fragmentos do espetáculo teatral’. No monólogo, Joana é uma mulher que embarca em suas lembranças para desvendar mistérios e nos apresenta sua casa, chamada de “Casa do Sossego”, na Ilha do Marajó, na foz do Rio Amazonas.
“Os Encantados do Sossego” conta a história da heroína, narradora e única testemunha da história da casa assombrada. No decorrer da história, Joana nos revela os eventos extraordinários – ora trágicos, ora fantásticos – que se abateram sobre ela e a família depois de decidirem morar nas terras marajoaras.
A história foi criada pela vivência na infância da diretora Monique DeBoutteville, que é paraense e tem raízes marajoaras, em Soure. “A Casa de Sossego é uma casa que realmente existe em Soure. Passei muito tempo lá, na casa da minha vó, tinha muitos casos e histórias em torno dela. Um dia pude entrar e tinham muitas coisas de 1900, cartas e roupas antigas. Era um lugar que ficava muito no meu imaginário. O espetáculo foi uma junção entre esse imaginário da infância, essa casa, minha infância no interior, acompanhando mestres contadores de histórias, pessoas que trazem uma linguagem estética, que tentei aprofundar na tese. Tentei colocar esses dispositivos que os contadores ativam para prender a nossa atenção naquela narrativa sobrenatural”, conta.
Encantados do Sossego resgata a tradição de sentar a família para ouvir histórias fantásticas. A peça tenta ser um convite para conhecer um lugar mágico e exaltar a cultura brasileira neste projeto idealizado, dirigido e produzido por mulheres.
Uma história de amor, de fraternidade, de respeito à natureza, aos ancestrais, às crenças de uma região mística, poderosa em magia e em pessoas. A peça foi escrita por Monique em 2014 e 2015 como tese de doutorado. Agora o espetáculo está sendo disponibilizado ao ser aprovada no edital “Cultura Presente na Redes”, do Governo do Estado do Rio de Janeiro.
A atriz Fernanda Thurann dá vida à Joana e a todos os outros personagens. Em uma transformação de cores, música, postura e feições, Fernanda assume os diversos personagens em uma atuação engajada. Apesar de ser curitibana Fernanda mergulhou na personagem marajoara encantada e nos seus dilemas.
“Ela tem ido para o Marajó de uma a duas vezes por ano, estudado muito e conversado com os mestres. Começou como uma experimentação e depois foi tomando corpo com um trabalho de muita pesquisa. Precisava de uma atriz que tivesse a disponibilidade de querer pesquisar”, agradece Monique.
“Os Encantados do Sossego” é uma experimentação que pode ser considerado um híbrido ao misturar a linguagem audiovisual e a arte cênica teatral. “É uma coisa híbrida, a gente até se questiona se pode chamar isso de espetáculo. Demos um nome um pouco extenso para isso, achamos que são ‘fragmentos audiovisuais de espetáculo’”, explica a diretora.
O espetáculo não é ao vivo, foi gravado e pensado para tentar conseguir alguns detalhes que o teatro por si só não consegue mostrar. “Essas formas todas vem de um hibridismo, que estamos inventando e reinventando, e que agora está no ápice com a inviabilidade de se reunir para partilhar as coisas presencialmente. Engraçado que estamos com vários projetos em andamento antes da pandemia e essa experiência está alterando muito a visão sobre esses projetos, de filmagens em cena, detalhes que a câmera vai buscar que o teatro não oferece para a gente”, detalha.
Mesmo se passando no Pará e bebendo da rica cultura paraense o espetáculo tem condições de agradar a todas as pessoas por tratar de questões femininas na sociedade. “É totalmente ligado à mitologia marajoara sourense. A Mulher Cheirosa é uma história muito bem situada em Soure, marcamos os espaços com isso”, conta.

“É o pano de frente da narrativa toda. Ela é baseada em histórias reais que me foram contadas de vivências, a Joana é um quebra-cabeça de várias histórias que eu pude estar coletando por todo esse período da tese, trabalhadas em um universo de ficção em um universo de entretenimento, em um fluxo de ideias e as ideias de que a pessoa tenha vivido isso”, considera.
Fonte: O Liberal/Cultura (Texto e Foto)

Nenhum comentário